Um transbordar de emoções que me pôs do avesso, a cada crônica, um pedaço de mim. Ameacei desistir por várias vezes, doeu demais, porém, a vida me convidava a concluir essa jornada. Aceitei, pari e aqui está: apresento meu fruto e os convido a apreciar.
"Deito-me sobre os ossos que me sobraram da morte-vida, para recuperar a sabedoria ali contida, do como renascer.
Decido, pela primeira vez na vida, fazer terapia para vasculhar os tortuosos caminhos da minha mente. Jornada para dentro, que faz colar as carnes nos ossos e a pele na carne.
Não sem dor, aflição e pavor, pois cada parte que se cola traz consigo o peso das memórias. Mas pesado mesmo é entender que dentro de mim estava o algoz e a vítima, sempre me colocando nas encruzilhadas, no caminho para as armadilhas.
Sem querer, sem saber, toda vez que me afastava da minha essência, para agradar ou ser aceita, estimulava minha vítima que, enfraquecida, dava sinais evidentes para qualquer algoz se aproximar.
Dor terrível, susto de perder o fôlego, descoberta que pode salvar. Saber que se é vítima já é o começo para lutar, liberar a culpa, despir-se da fragilidade e, ao menos, fingir que tem coragem.
Com carnes mais firmes nos ossos e pele mais grossa, de tanto fingir coragem, ela aparece. Coragem para me perdoar por não ter tido escolhas em algum momento da vida, coragem para aceitar que, quando escolhi, caminhei para a morte, coragem de liberar essas escolhas e lidar com as consequências, coragem de me fazer as perguntas da alma, sabendo que as respostas me levariam a atitudes avassaladoras e coragem para reunir os ossos e recomeçar sempre que necessário for.
Cada questão importante da vida é revisitada, questionada, escancarada, até desnudar toda a verdade. Mistérios são revelados, o assombro se instala.
Esse corpo que nasceu e morreu várias vezes na mesma vida, para se manter forte diante de tantas idas e vindas, precisa de atenção e cuidado plenos, de respiração profunda, daquela que oxigena cada pedaço de mim, irrigação de acolhimento e afeto, que nesse momento, apenas eu poderia dar.
Descansar em lugar seguro, deitar em meu próprio colo, sentir meus abraços, falar com meu coração, me enrolar no cobertor macio, tomar uma xícara de chocolate quente e depois dormir para permitir a ação do tempo a me reestabelecer.
Permitir que o tempo abraçado em minhas novas escolhas costure cada parte de mim, de tal forma que as cicatrizes pelo menos não fiquem em relevo.
Entendi muitos dos meus porões quando levei um facho de luz para lá. Vi poeira, livros velhos que tinha lido e não feito nada com o que aprendera, restos de ossos de outras mulheres cujas mortes não foram em vão, pois apesar de terem morrido nas mãos de seus algozes, me anunciaram a possibilidade de que desses mesmos ossos é possível despertar.
Escolhi novos caminhos sem a certeza de que me levariam aonde queria. Mas agora, mais atenta, farejo cada canto, sei a hora de ser boazinha e a hora de não ser e passei a entender que, se algo parece estranho, com certeza é estranho, o suficiente para me colocar na direção contrária.
Entendi que, quando a gente descobre que é a vítima, pode deixar de ser. Que não existe apenas isso ou aquilo. Tem sempre um terceiro caminho, que, por alguma razão, ninguém quer que você descubra.
Tomada pela falta de energia que era toda roubada, tentando agradar, agora sinto forças para seguir, enfrentar e continuar iluminando meus próprios cantos escuros da alma.
Atenta ao meu coração, sou rigorosa com minhas verdades e com meu sentir. Se sinto que está estranho, ouço, amplifico, respeito, acato. Quando é para seguir, vou, entrego.
Revigorada, hoje faço a poda daquilo que já serviu, mas que agora atrapalha. Limpo, deixo ir, simplifico, para liberar espaço e energia para o novo."
Esta crônica é parte do livro.
Em "Vou alí e já volto", a jornada é mais longa do que imaginado, quarenta anos são necessários para encontrar a "saída" de um labirinto emocional, sobreposto de camadas de medo, culpa, inadequação, violência, enfrentamento da morte em suas múltiplas facetas, ilusões sucessivas, realidade vivida pela maioria das mulheres.
Uma viagem individual que conduz a busca dos próprios recursos, exige coragem para enxergar o que tem de ser visto e abertura para pedir ajuda quando necessário. Tudo isto sem perder de vista o reconhecimento das próprias necessidades emocionais, transpor as falsas ilusões que não levam a lugar algum, de colocar limites nos outros e em si mesma quando preciso for e de assumir a responsabilidade de cuidar da própria vida. Sem isto, a jornada pode se tornar um deserto intransponível com sérias consequências nos relacionamentos, na vida e na carreira.
Para encontrar "esse lugar" é necessário extrair aprendizados de cada experiência vivida e, como uma alquimista, procurar a cura para cada uma de suas feridas. O resultado é a liberdade e a leveza para uma vida mais autêntica, cheia de propósito e significado.
Acompanhe esta jornada de transformação em algumas das crônicas mais viscerais e sinceras que você talvez já tenha visto sobre o universo feminino.
O livro Vou Ali e já Volto - 40 anos no deserto, já está disponível para compra pela Amazon.
Desejo a você uma ótima leitura!
Um abraço afetuoso,
Adriana
Strengths Coach certificada pelo Gallup® Institute
Executive Coach Certificada pelo Integrated Coaching Institute (ICI)
Certificação Internacional em Coaching Integrado